sexta-feira, fevereiro 02, 2007

...de J.G.Ferreira

A minha solidão
não é uma invenção
para enfeitar noites estreladas...
... Mas este querer arrancar a própria sombra do chão
e ir com ela pelas ruas de mãos dadas.
...Mas este sufocar entre coisas mortas
e pedras de frio
onde nem sequer há portas
para o Calafrio.
...Mas este rir-me de repente
no poço das noites amarelas...
- única chama consciente
com boca nas estrelas.
...Mas este eterno Só-Um
(mesmo quando me queima a pele o teu suor)
- sem carne em comum
com o mundo em redor.
...Mas este haver entre mim e a vida
sempre uma sombra que me impede
de gozar na boca ressequida
o sabor da própria sede.
...Mas este sonho indeciso
de querer salvar o mundo- e descobrir afinal que não piso
o mesmo chão do pobre e do vagabundo.
...Mas este saber que tudo me repele
no vento vestido de areia...
E até, quando a toco, a própria pele
me parece alheia.

Não. A minha solidão
não é uma invenção
para enfeitar o céu estrelado...
... mas este deitar-me de súbito a chorar no chão
e agarrar a terra para sentir um Corpo Vivo a meu lado.

José Gomes Ferreira

2 comentários:

Mila disse...

BRUTAL

Profundezas disse...

Adoro este poema, simplesmente adoro. Há anos que o sei de cor, e há anos que "não me lembrava dele"... É tão intenso! O bom gosto impera neste Blog. Um abraço.