sexta-feira, novembro 24, 2006

...filosófico


..."Não possuo filosofia, em que possa mover-me como o peixe na água ou o pássaro no céu. Tudo em mim é um duelo, uma luta travada a cada minuto da vida entre falsas e verdadeiras formas de consolo. Umas não fazem senão aumentar a impotência e tornar-me mais fundo o desespero, outras são fonte de temporária libertação. Falsas e verdadeiras! Deveria antes dizer verdadeira, pois só existe uma consolação verdadeiramente real: a que me diz que sou um homem livre, um indivíduo inviolável, ser soberano no interior dos seus limites.

Mas a liberdade começa na escravidão e a soberania na dependência. O sinal mais vivo da servidão é o medo de viver. O definitivo sinal de liberdade é o facto de o medo deixar espaço ao gozo tranquilo da independência.

Dir-se-á que preciso de ser dependente para conhecer o gozo de ser livre! É certamente verdade. À luz dos meus actos, percebo que toda a minha vida parece não ter tido por objectivo senão construir o seu próprio infortúnio: sempre me escravizou o que devia tornar-me livre."
...

Stig Dagerman - a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer
versão de paula castro e josé daniel ribeiro, fenda edições, 1989

Logo de manhã, ao despertar, ouvi no rádio uma citação, que seria do António Barreto, no Público em que, se bem me lembro, ele diria que se estava a "matar a Filosofia como cadeira estruturante".

Áquela hora e ouvido assim, não percebi a importância da idéia, mas agora 12 horas depois e depois de me ter surgido á frente o texto que guardei acima, lembrei-me da citação e fez-se luz finalmente.

É verdade que também não me saía muito bem na disciplina de filosofia, mas reconheço que ela faz falta. É importante saber pensar o pensamento, e o pensamento científico é importante mas não chega ...

Já diz Edgar Morin em As grandes questões do nosso tempo:

"Saber ver necessita saber pensar o que se vê. Saber ver implica portanto saber pensar, como saber pensar implica saber ver. Saber pensar não é algo que se obtenha por técnica, receita ou método. Saber pensar não é apenas aplicar a lógica e a verificação aos dados da experiência. Isso supõe também saber organizar os dados da experiência. Precisamos portanto de compreender que regras, que princípios comandam o pensamento que nos permite organizar o real, isto é, seleccionar, privilegiar certos dados e eliminar, subalternizar outros. Precisamos de adivinhar a que pulsões obscuras, a que necessidades do nosso ser, a que idiossincrasia do nosso espírito obedece ou responde o que temos por verdade. Numa palavra, saber pensar significa indissociavelmente saber pensar o seu pensamento. Necessitamos de nos pensar pensando, de nos conhecer conhecendo. Essa é a exigência reflexiva fundamental, que não é tão-só a do filósofo profissional, que não deveria estender-se apenas ao cientista, mas que deve ser a de cada um e de todos."

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